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“Por que tantos jovens concluem estudos sem desenvolver verdadeiro espírito crítico?”[1]

Atualizado: 26 de abr. de 2021


XAVIER, Josilda B.L.M. [2]


No dia 9 de janeiro de 2021, foi publicado no site da BBC News - Brasil, um artigo de Francisco Esteban Bara (The Conversation*), professor associado do Departamento de Teoria e História da Educação da Faculdade de Educação da Universidade de Barcelona, na Espanha, com o título “Por que tantos jovens concluem estudos sem desenvolver verdadeiro espírito crítico?”, que me chamou a atenção.


Essa é uma questão que me preocupa há muitos anos.


Trabalho com a formação de professores e, quando os graduandos do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, no qual leciono, estão desenvolvendo atividades da Disciplina Estágio Supervisionado, relatam a dificuldade que têm em promoverem argumentações com um nível maior de criticidade sobre o conteúdo que estão abordando em sala de aula com seus alunos, fico a me perguntar onde estamos errando!?


A dificuldade relatada ocorre tanto na dificuldade que o graduando tem de elaborar um argumento, no qual a transposição didática do conteúdo científico trabalhado, possa colaborar com o desenvolvimento da criticidade em seus alunos, como, também, na dificuldade dos estudantes do Ensino Básico de elaborarem questões que promovam uma reflexão mais crítica sobre o que está sendo discutido em sala de aula.


É importante não esquecermos que os conteúdos trabalhados em Ciências e Biologia em nível de Ensino Básico, correspondem a todos os contextos nos quais a humanidade está inserida e/ou necessita: fisiologia do corpo humano e todas as variáveis que estão envolvidas (alimentação, reprodução, saúde, doença, vírus, bactéria..., pandemia); sistema terrestre (composição e relação entre os constituintes biogeofísicos e químicos); aquecimento global (desmatamento, produção de energia, poluição, lixo etc.); entre outros.


Por que a falta de “espírito crítico” em nossos jovens ocorre? Esse é um problema brasileiro, apenas? A formação intelectual, o desenvolvimento cognitivo de crianças e jovens, atendem às exigências que o contexto societário, no qual vivemos, exige de todos nós?


O autor do artigo - Bara (2021) -, chama a atenção para o fato de que “o espírito crítico nos liberta da ignorância”, ou seja, nos liberta de “qualquer pessoa ou coisa que queira pensar por nós; e já sabemos que estamos rodeados de pessoas e dispositivos tecnológicos dispostos a isso”. A partir dessa observação, nos convida a refletirmos sobre como tudo o que está ao nosso redor são do jeito que são e não de outra forma; “descobrir verdades e desmantelar falsidades”; e lembra-nos da máxima “só sei que nada sei”, usada por Sócrates (Alópece, c. 469 a.C. - Atenas, 399 a.C), filósofo grego que não cansava de promover questionamentos a todos que o cercava.


A partir do “convite” que o artigo nos faz, no sentido de refletirmos sobre as razões que estão conduzindo a humanidade a não pensar de forma crítica e dialogicamente, não é possível deixar de pensar em um brasileiro que, muito tenazmente, provocou e ainda provoca reflexões sobre a forma pela qual os humanos não sejam “coisificados”. Estou me remetendo ao sociólogo e grande educador, Paulo Freire (Recife, 1921 – São Paulo, 1997) que, em seus trabalhos, sempre destacou o “diálogo como uma espécie de postura necessária, na medida em que os seres humanos se transformam cada vez mais em seres criticamente comunicativos. O diálogo é o momento em que os humanos se encontram para refletir sobre sua realidade tal como a fazem e refazem. [...] O que é o diálogo, neste momento de comunicação, de conhecimento e de transformação social? O diálogo sela o relacionamento entre os sujeitos cognitivos, podemos, a seguir, atuar criticamente para transformar a realidade (FREIRE e SHOR, 1997 in PESCE; BRUNO; HESSEL, 2018).


Nesse contexto, é importante pensarmos no significado da Alfabetização científica, na perspectiva conceitual de alfabetização emancipatória de Freire (2005), e na forma como Chassot (2003, 2006) vê a Alfabetização Científica como um “conjunto de conhecimentos que daria aos indivíduos condições de fazerem uma leitura do mundo onde vivem, contribuindo para o controle e previsão das transformações que acontecem na natureza, conduzindo-as para a melhoria da qualidade de vida socioambiental, como uma forma de fazer a inclusão social.”


Enquanto docente, a partir das provocações que o artigo de Francisco Esteban Bara (2020), penso ser necessário promover, sempre, ações que possibilitem que os alunos sejam capazes de raciocinar e usar ferramentas e práticas científicas para a resolução de problemas, além de compreender os fenômenos naturais e tecnológicos. E, comungo com as afirmações de Pesce, Bruno e Hessel (2018), no que se refere ao entendimento de que o “trabalho docente deve orientar os alunos para que, muito mais que a capacidade de ‘ler a ciência’, eles consigam discuti-la e opinar sobre ela, fazendo parte de sua cultura e, assim, poder ‘ler o mundo’ em que vivem e atuar no controle e previsão de suas transformações, visando a melhoria da qualidade de vida socioambiental e a inclusão social consciente, crítica e emancipatória”.


Desse modo, ouso provocar-me, cotidianamente, no sentido de desenvolver a habilidade do pensamento crítico, numa perspectiva de problematizar as ações investigativas e pedagógicas que constituem o meu (re)fazer docente, de modo que, quem sabe (!), possa contribuir com a formação de futuros professores de Ciências e Biologia que se preocuparão com a organização de uma nova estrutura societária, na qual a população brasileira conquistará sua emancipação política-científica-socioambiental, numa perspectiva ética, solidária e humanizada.



[1] Título do texto escrito por Francisco Esteban Bara, publicado em: https://theconversation.com/como-fomentar-el-espiritu-critico-en-los-jovenes-sin-convertirlos-en-opinadores-de-todo-149417


[2] Docente do Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da UNEB/DEDC/Campus VIII. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/0838920937933125




REFERÊNCIA


BARA, Francisco Esteban. Por que tantos jovens concluem estudos sem desenvolver verdadeiro espírito crítico? BBC News – Brasil. 9 de janeiro de 2021. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-55476570.


BARA, Francisco Esteban. Cómo fomentar el espíritu crítico en los jóvenes sin convertirlos en opinadores de todo. The Conversation - Publicado em: 17 de novembro de 2020. Disponível em: https://theconversation.com/como-fomentar-el-espiritu-critico-en-los-jovenes-sin-convertirlos-en-opinadores-de-todo-149417


CHASSOT, A. I. Alfabetização científica: uma possibilidade para a inclusão social. Revista Brasileira de Educação, 22, 89-100. 2003.


CHASSOT, A. I. Alfabetização Científica: questões e desafios para a educação (4a). Ijuí: Ed. Unijuí.2006.


FREIRE, P. A importância do ato de ler – em três artigos que se completam. São Paulo: Cortez. 2005.


FREIRE, Paulo; SHOR, Ira. Medo e ousadia: o cotidiano do professor. Trad. A. Lopez. 7. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.


PESCE, Lucila; BRUNO, Adriana Rocha; HESSEL, Ana Maria Di Grado. A premissa dialógica como elemento fundante da Formação de educadores: um intertexto entre Freire, Morin e Latour. Revista Educere Et Educare, Vol. 13, N. 28, maio/agos. 2018.



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