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CONSERVAÇÃO DA NATUREZA E PROGRESSO SOCIAL: A AMBIGUIDADE SOB A ÓTICA DA RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS [1]

SOUZA, Glenda Riane das Neves [2]

SOUZA, Vinícius de [3]

Universidade do Estado da Bahia – UNEB

A inovação é um dos fatores essenciais associados ao pleno desenvolvimento das nações (BASSALO; TORKOMIAN, 2017), estando atrelada ao crescimento econômico e ao acúmulo de capital. O progresso social, compreendido por Cunha (2012) como crescimento socioeconômico e prosperidade inesgotáveis, está, contudo, fortemente interligado ao consumo desenfreado dos recursos naturais, tornando-se, nessa perspectiva, algo contrário à conservação da diversidade biológica. Desse modo, o progresso, que deveria auxiliar a sociedade, acaba configurando-se como uma armadilha.

Essa armadilha, que se caracteriza pelo excesso de consumo dos recursos naturais existentes, se concretiza na ampla destruição e degradação de florestas e rios, na perda da biodiversidade, em catástrofes climáticas, nas injustiças ambientais e sobretudo na diminuição da qualidade de vida dos seres humanos. A destruição dos recursos naturais é resultado de um modo hegemônico de desenvolvimento social pautado na demasiada apropriação materialista da natureza como principal fonte para o desenvolvimento econômico, orientando-se por uma noção cientificista que atua inferiorizando saberes não científicos, tais como valores, práticas sociais e modos de vida (GOMES, 2012), bem como as cosmovisões dos povos originários.

Tal situação é perceptível no cenário atual quando observamos a situação em que a Floresta Amazônica se encontra. A amazônia é considerada a maior floresta do mundo, abrangendo nove estados brasileiros (Amazonas, Acre, Amapá, Mato Grosso, Maranhão, Pará, Roraima, Rondônia e Tocantins), correspondendo a cerca de 58% do território nacional (IBGE, 2020). A floresta amazônica é amplamente conhecida por possuir grande diversidade ambiental e mineral, sendo abrigo de milhares de espécies, um de seus patrimônios mais expressivos e algo que desperta o interesse de toda a comunidade científica mundial (LENTINI et al., 2003).


Por sua riqueza e seu extenso tamanho territorial atraírem o interesse de diversos países, surgem então corrupções e ilegalidades em determinadas áreas da floresta, tendo como principal consequência o desmatamento (FEARNSIDE, 2002). Conforme informações obtidas pelo Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), o número de alertas registrados nos cinco primeiros meses do ano de 2022 é considerado o maior desde o ano de 2016; durante esse período, ocorreu a contabilização de aproximadamente 2.700 km² de áreas sob alerta, o que estima maiores resultados futuros (INPE, 2022 apud PRIZIBISCZKI, 2022).

O acúmulo apresentado no ano de 2022 já representa 21% de tudo que foi desmatado durante o ano de 2021, quando cerca de 13.000 km² de florestas foram desmatadas. Estima-se que, se o desmatamento continuar seguindo tal ritmo, pode-se chegar no ano atual com aproximadamente 15 mil km² de destruição na Amazônia (PRIZIBISCZKI, 2022).


O papel que a ciência moderna têm na compreensão e intervenção no mundo, fragmentando os saberes, acaba por dificultar a compreensão crítica de uma série de aspectos políticos, econômicos, sociais e culturais dos problemas ambientais existentes. Tal fato acaba configurando, portanto, a crise ambiental enquanto uma crise social, o que indica que a busca pela conservação da natureza deve estar fortemente atrelada à busca pela emancipação social (GOMES, 2012).


De acordo com Speligh (2022), levando em consideração os níveis atuais de pressão sobre o planeta Terra, já é previsível uma emergência humanitária pelo demasiado aumento das crises ambientais, econômicas, sanitárias e sociais em escala global; nesse momento, uma grande mobilização social para enfrentar esses problemas é de suma importância para buscar as transformações necessárias para melhorar a vida em sociedade.


Larry Laudan (1941-2022), epistemólogo, físico e filósofo estadunidense, estabelece, conforme Batista e Peduzzi (2019), “a ciência como uma atividade intelectual e como maneira prática de resolução de entraves”, divergindo de outros ideais vigentes, pois a “resolução dos problemas, embora tão importante para o desenvolvimento da ciência, era constantemente ignorada pelos cientistas, historiadores e filósofos das ciências” (LAUDAN, 2011).

Conforme Laudan (2011), a ciência, e consequentemente a sociedade, só vivenciarão o progresso quando “novas teorias e ideias resolvam mais problemas que as anteriores.” Desse modo, é possível relacionar os ideais do autor com a questão ambiental vivenciada no país: enquanto o progresso estiver pautado apenas no intensificado acúmulo de capital e não buscar resolver os problemas existentes no planeta, será impossível a existência de um progresso preocupado com a sustentabilidade socioambiental. Para Bassalo e Torkomian (2017), “é inaceitável que nos dias atuais ações e instrumentos de política pública estejam voltados exclusivamente para o crescimento econômico e acúmulo de capital, desconsiderando a vida das pessoas, suas particularidades, bem como a relação com meio ambiente que as cerca”.


O desenvolvimento sustentável surge, portanto, graças à necessidade existente de promover e manter o desenvolvimento econômico, buscando sempre satisfazer os interesses e as necessidades da geração atual, visando não comprometer a vida e o desenvolvimento das futuras gerações (DE OLIVEIRA, 2002).


Com base no exposto, conclui-se, portanto, que os problemas socioambientais enfatizam a destruição da natureza por completo, gerando um emaranhado de graves problemas em nosso planeta. Nesse contexto, é fundamental que as pesquisas científicas não apenas analisem as transformações necessárias para a sustentabilidade do meio ambiente como, também, contribuam ativamente para que elas aconteçam. A ciência da transformação busca inovações em diferentes áreas, como nas metodologias de pesquisas, na produção participativa de conhecimentos e na capacitação dos pesquisadores e instituições para essas formas de fazer ciência.

Além disso, precisa-se que todos estejam disponíveis e aptos para compreender a ocorrência, de fato, da conservação da biodiversidade, por meio do conhecimento científico, crítico e político. Através desses âmbitos pode-se trazer as mudanças de mentalidade da sociedade, pois, no que tange ao meio ambiente, dependemos inteiramente dos recursos naturais e da diversidade biológica que são fortemente violados e destruídos por conta de questões econômicas e do “progresso” social, predatórios.



[1] Texto produzido para a disciplina Epistemologia da Ciência, como etapa avaliativa do semestre 2022.2 do Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas / UNEB / DEDC– Campus VIII. Publicação no BioBlog/LabCriat-Umbuzeiro (https://www.labcriatumbuzeiro.com/), em 12/12/2022.


[2] e [3] Discentes do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade do Estado da Bahia—UNEB / DEDC / CAMPUS VIII.




REFERÊNCIAS

BASSALO, GISA HELENA MELO; TORKOMIAN, ALV. Inovação e Progresso Social na América Latina: Uma Visão Sintética. 2017.


BATISTA, C. A. S.; PEDUZZI, L. O. Q. Concepções epistemológicas de Larry Laudan: uma ampla revisão bibliográfica nos principais periódicos brasileiros do ensino de Ciências e ensino de Física. Investigações em Ensino de Ciências, [S. l.], v. 24, n. 2, p. 38–55, 2019.


CUNHA, Mary Louiselle do Prado. Desmatamento e progresso na Amazônia Legal: movimento ecológico e as políticas econômicas da Ditadura Militar (1964-1985). Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal de Mato Grosso. Cuiabá, p. 164. 2012.


DA FONSECA, Igor Ferraz; LINDOSO, Diego Pereira; BURSZTYN, Marcel. (Falta de) controle do desmatamento na Amazônia brasileira: do fortalecimento ao desmantelamento da autoridade governamental (1999-2020). Sustainability in Debate, v. 13, n. 2, p. 12-31, 2022.


DE OLIVEIRA, Gilson Batista. Uma discussão sobre o conceito de desenvolvimento. Revista da FAE, v. 5, n. 2, 2002.


DULCE, Emilly. Na contramão do agronegócio, terras indígenas lideram preservação e reflorestamentos. Brasil de Fato. 2019. Disponível em: https://www.brasildefato.com.br/2019/08/26/na-contramao-do-agronegocio-terras-indigenas- lideram-preservacao-e-reflorestamentos


FEARNSIDE, Philip M. Desmatamento na Amazônia brasileira: história, índices e consequências. Megadiversidade, v. 1, n. 1, p. 113-123, 2005.


FERREIRA, Evandro. Natureza e biodiversidade não são empecilhos para o progresso. Blog Ambiente Acreano. 2020. Disponível em: https://ambienteacreano.blogspot.com/2020/08/natureza- e-biodiversidade-nao-sao.html


GOMES, Jacqueline Martins. Conservação da natureza e emancipação social: um estudo de caso sobre a comunidade de Santa Maria de Caiaué e sua relação com a Floresta Nacional.


GORTÁZAR, Naiara Galarraga. Recorde, fúria dos incêndios na Amazônia se intensifica em setembro. El País. 2020. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2020-10-01/recorde-furia- dos-incendios-na-amazonia-e-no-pantanal-se-intensifica-em-setembro.html


IBGE. Amazônia Legal. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 2020. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/geociencias/cartas-e-mapas/mapas-regionais/15819-amazonia-legal.h tml?=&t=acesso-ao-produto. Acesso em 13 nov. 2022.


LAUDAN, L. O progresso e seus problemas: rumo a uma teoria do crescimento científico. São Paulo: Unesp, 2011.


LENTINI, Marco et al. Fatos florestais da Amazônia 2003. Imazon, Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, 2003.


PAU-ROSA, Maués, Amazonas. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Sustentável) - Universidade de Brasília. Brasília, p. 162. 2012.


PRIZIBISCZKI, Cristiane. Desmatamento acumulado em 2022 na Amazônia é o maior em sete anos. ((o)) eco, 2022. Disponível em: <https://oeco.org.br/noticias/desmatamento-acumulado-em- 2022-na-amazonia-e-o-maior-em-sete-anos/>


SPEGLICH, Érica. Problemas Socioambientais Demandam Construção Colaborativa De Conhecimentos E Soluções. Biota Fapesp, 2022. Disponível em: <https://www.biota.org.br/problemas-socioambientais-demandam-construcao-colaborativa-de- conhecimentos-e-solucoes/>


WEINBERG, Justin. Larry Laudan (1941-2022). Dailynous. 2022. Disponível em: https://dailynous.com/2022/08/31/larry-laudan-1941-2022/

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